- Porque é que eu estou aqui? - perguntou Adão, num sentido existencial.
- Porque é que não estás com a Eva? - interrogou-o Deus, num sentido literal.
Adão coçou estupidamente a cabeça.
- Não sei. - respondeu.
Deus descaiu os ombros, com desânimo, e disse:
- Adão és um idiota.

Dás-me raiva?

imagem de addicted2cyanide

Odeio-te.
Sem ponto de exclamação.
Não é um ponto que expressa a emoção.
Os sinais da raiva são muitos mais. São a vontade de te sangrar.
Matar.
De te enlaçar as mãos à volta do pescoço, e afundar-te a cabeça na água gelada do poço, até sentir a vida a ir por entre os dedos que não te deixam respirar.
É isso, e mais. Muito mais. Dos crimes horríveis às pequenas coisas risíveis.
Até a mesquinha vontade de sorrir de cada vez que cais.
A raiva é descarnada.
É um monstro sem corpo, feito de veias e mais nada.
O ódio é o vencedor dessa disputa. É aquilo que sobe ao lugar mais alto do pódio quando termina a luta.
É uma batalha sem vencedor. É a dança no fio da navalha, onde cada desequilíbrio é má sorte. É corte. É dor.
Odiar é amar ao contrário.
É uma vida pervertida que sai morta da barriga.
É uma oração infindável que não precisa de contas nem rosário.
É, no fim do dia, a falta de uma voz amiga.
Raiva de verdade é morrer de saudade.
É raiva pelo tempo que passa, como se os dias fossem lobos e nós a caça.
É a mancha de sangue que fica no branco da neve, depois da matança da foca. Às vezes, é o terror que vem pelo escuro. É mortífero e breve. Os dentes do predador obscuro que vai buscar as crias à toca.
Ninguém está em segurança. Não adianta alimentar essa esperança.
Ninguém vive suficientemente alto, nem tão absolutamente lá no fundo.
Não há distância que nos deixe longe disso.
A raiva é um querer bicho.
É um verme que se alimenta de nós. Cresce-nos na voz.
Matar a raiva é calar o que se quer dizer de rancor.
Mas, matá-la mesmo, é deixá-la pensar que venceu e, depois, envenená-la com amor.

Lá em cima é muito alto?

imagem de FrozenYearning

E se não chegares lá?
E se o coração que queres apanhar tiver asas para voar?
Ainda há vontade?
Ainda há, de verdade?
Há?
Não se pode subir numa escada até ao céu.
A distância não é só saudade, nem o sacrifício da verdade. É a cortina do teatro que desce sobre o último acto. É a face mascarada sob o véu.
É o avançar do último passo. O teu e o meu.
É o fim do caminho quando o coração se sente sozinho.
Lá, no topo da sua escada mágica, como se subisse ao pico da mais alta montanha, com a intenção de uma descida trágica, carregando no peito aquela tristeza que o acompanha.
É assim o coração que vive lá em cima.
Mundos de distância acima de um tecto.
Para além de qualquer afecto.
Um querer impossível para quem o estima.
E se pudesses subir a escada?
E se cada degrau fosse só um pequeno nada?
Subias ao céu?
Reclamavas o que é teu?

E se o chão te oferecer uma flor?

imagem de UnRealLife

Aceita.
Se da pedra surgir vida, não deixes que o destino decida.
Aceita.
Faz desse gesto um romance que começou com um pequeno nada.
Aceita-a do chão. Diz que sim. Antes que, no próximo passo, fique esmagada.
Colhe essa flor. Dá-lhe água e calor. Vais ver. Deixa-a crescer.
Dar-te-á um jardim. E, à sua volta, uma floresta encantada.
Uma vez, aceitei uma flor vinda do ar.
Bastou-me estender a mão para aceitar.
Não parece um esforço impossível, é verdade.
Mas, às vezes, a flor é invisível quando o chão é a crua vaidade.
Algumas flores caem como se ouvissem um não.
É a recusa da cegueira das pessoas que não vêem à primeira.
Não faz mal.
Quando não se vê, não vale.
A flor só está pronta a colher quando os olhos estão prontos para a ver.
Se a flor te falar e disser o teu nome, não te assustes.
É só até o pensamento se acostumar. Depois, o coração faz os ajustes.
Colher uma flor é um gesto de amor.
É um sorriso de cor.
É um beijo de carinho.
É um abraço que deixa de estar sozinho.
Se, um dia, o chão te oferecer uma flor, aceita esse gesto de impossível valor.
Pega-lhe com delicadeza. Respeita-lhe a leveza.
O afecto não é uma causa perdida.
Nem uma ilusão diluída.
O futuro é uma espécie de amor prometido por um adivinho.
Aceita essa flor e leva-a contigo o resto do caminho.
Guarda-a para a vida.

Esse é o teu beijo?

imagem de Bruna161

Queres-me assim?
Dás-me um simples beijo e dizes que é só desejo?
Se um beijo é apenas isso, não quero.
Quero sentir-me a melhor pessoa do mundo, na flor da inocência, a descobrir a vida, numa noite limpa de céu estrelado. Quero fechar os olhos e sentir aquela fraqueza nas pernas que dá receio de cair para o lado.
Se o teu beijo não é isso, eu espero.
Espero por quem beije melhor.
Não vou esperar que aprendas, por muito que essa mágoa me arraste para o fundo da dor.
A vida tem o seu jeito de nos encontrar outras pessoas. É nosso o erro se pensarmos que essas pessoas serão todas boas.
O passado foi o que foi.
E não importa se ainda dói.
O presente é como é.
Um breve instante de fé.
O futuro será como for.
O eterno sonhador.
Haverá beijos que se colam a mim sem princípio, meio nem fim. Uns serão contos de fadas, outros não passarão de tentativas falhadas.
Não vou esperar por ti sem saber se existes, porque é procurar para não encontrar.
Isso é um beijo desencontrado em que, a meio, desistes e eu fico sem saber o que é beijar.
Por agora, enquanto a minha sorte se demora, penso em coisas boas para não desesperar para além da hora.
Penso no meu beijo que vai além do desejo.

Achavam mesmo que eu tinha respostas?

Estão à espera que responda?

FAQed

A minha foto
cada um sabe de si (si, de mim, não de você... você sabe de si, ou seja, cada um sabe de você... vendo bem, todos sabem de si)
Achas que o mundo é uma equação estranha sem fórmula de resolução? Já pensaste enfiar os queixos na droga mas, ah e tal, isso custa os olhos da cara? Já ponderaste (seriamente) vender os olhos da cara para enfiar os queixos na droga? Parece-te que és vítima de mau-olhado frequente e/ou persistente? Já correste tudo quanto é bruxo charlatão e uma catrefada de senhoras que acham que a palma da mão é um bilhete de identidade metafísico? Resumindo... não regulas bem da cabeça?Pois não desesperes! A cura (vá, terapia... não queremos ser demasiado optimistas) para toda essa angústia EXISTE! A comunidade científica mais céptica dirá que é um placebo mas, afinal, o que raio sabem esses! Por fim... tcharan! O caminho para a CURA (terapia, vá): thefaqer[at]gmail[dot]com

Apelo à cidadania.

Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons. Nada de roubalheiras literárias, pode ser? (se não puder ser, que as mentes larápias se transformem numa lesma em decomposição... uma ratazana cadavérica também serve... conhecem o termo "esforriqueira"?... bem, isso adequa-se ao estado de matéria em que devem ficar os órgãos internos dos/as prevaricadores/as)