foto de LabyrinthWitch
(não fiquem tristes... são apenas palavras)
Na entrada do circo, estava um palhaço. Era uma entrada saída. Era um palhaço não palhaço.
O circo era um velho castelo de lona morta. O vermelho vivo já não o era. Sobrevivia um resquício de glória nas costuras onde a chuva entrou menos e o sol não brilhou jamais.
A abertura era apenas um rasgão de tecido ressequido, como um golpe na pele de uma pessoa muito velha, que demora a sangrar.
Pois a ferida da lona já não tinha sorrisos para sangrar. Riso esquecido, palhaço entristecido.
Depois, os trapezistas migraram para sul. Dizem que eles estavam fartos de voar nas cordas e que criaram asas.
O palhaço gostaria de sorrir e acreditar que sim. Mas ele sabia que não.
Os trapezistas enfrentaram a falta de espanto do público, sem rede... morreram todos no chão.
E o ilusionista? Esse, o palhaço sempre soube que tinha algo mais na manga para além da mão. Esse seguiu caminho que, para iludir, bastava-se sozinho.
O palhaço deixou-se ficar entre o rasgão da lona, como se fosse ele a faca. Lá fora, o céu ameaçava com chuva. Ambos tinham a cara cinzenta.
A cor do céu era água de nuvens furiosas.
A cor do palhaço era apenas tinta.
A chuva veio.
O palhaço entristecido pensou em todas as feras que cresceram nos úteros encarcerados das jaulas.
Os leões já não rugiam o seu poderio majestoso, para não perderem a dignidade diante do estalar do chicote. Todas as chicotadas no ar eram apenas farsas. O domador e as feras eram apenas actores que contracenavam na mesma peça... secretos comparsas.
A água caiu do céu e a terra subiu do solo. Ambas se misturaram em lama, como se fosse um canto triste de um pássaro que já não existe, ou de um amante abandonado na cama.
E os equilibristas? Esses, não ganharam asas. Ganharam juízo e desistiram da ilusão do balanço perfeito. Desceram do arame e esqueceram os cilindros rolantes. O juízo fê-los duvidar da possibilidade do equilíbrio... já nada poderia voltar a ser como dantes. Decidiram viver sentados. Quietos. Perfeitamente equilibrados.
Ficou mais frio.
A água guardada na flor de esguicho da lapela gelou no tubo de plástico, junto ao peito. O palhaço sentiu-a como o próprio sangue que se despedia do calor do corpo.
E o mestre do picadeiro? O entusiasmo desse exuberante apresentador era falso ou verdadeiro?
Reformou-se. Passou a sobreviver de uma pensão que lhe trazia tudo menos dinheiro.
O palhaço?
Bem, o palhaço olhou para o céu (o horizonte dava-lhe um aperto no coração). O rosto do céu chorava e o rosto do palhaço aceitava.
Era tarde. Estava na hora de mais um espectáculo. Mais uma vez, faria rir cadeiras vazias.
Voltou para dentro.
O espectáculo tinha de continuar.
O circo era um velho castelo de lona morta. O vermelho vivo já não o era. Sobrevivia um resquício de glória nas costuras onde a chuva entrou menos e o sol não brilhou jamais.
A abertura era apenas um rasgão de tecido ressequido, como um golpe na pele de uma pessoa muito velha, que demora a sangrar.
Pois a ferida da lona já não tinha sorrisos para sangrar. Riso esquecido, palhaço entristecido.
Depois, os trapezistas migraram para sul. Dizem que eles estavam fartos de voar nas cordas e que criaram asas.
O palhaço gostaria de sorrir e acreditar que sim. Mas ele sabia que não.
Os trapezistas enfrentaram a falta de espanto do público, sem rede... morreram todos no chão.
E o ilusionista? Esse, o palhaço sempre soube que tinha algo mais na manga para além da mão. Esse seguiu caminho que, para iludir, bastava-se sozinho.
O palhaço deixou-se ficar entre o rasgão da lona, como se fosse ele a faca. Lá fora, o céu ameaçava com chuva. Ambos tinham a cara cinzenta.
A cor do céu era água de nuvens furiosas.
A cor do palhaço era apenas tinta.
A chuva veio.
O palhaço entristecido pensou em todas as feras que cresceram nos úteros encarcerados das jaulas.
Os leões já não rugiam o seu poderio majestoso, para não perderem a dignidade diante do estalar do chicote. Todas as chicotadas no ar eram apenas farsas. O domador e as feras eram apenas actores que contracenavam na mesma peça... secretos comparsas.
A água caiu do céu e a terra subiu do solo. Ambas se misturaram em lama, como se fosse um canto triste de um pássaro que já não existe, ou de um amante abandonado na cama.
E os equilibristas? Esses, não ganharam asas. Ganharam juízo e desistiram da ilusão do balanço perfeito. Desceram do arame e esqueceram os cilindros rolantes. O juízo fê-los duvidar da possibilidade do equilíbrio... já nada poderia voltar a ser como dantes. Decidiram viver sentados. Quietos. Perfeitamente equilibrados.
Ficou mais frio.
A água guardada na flor de esguicho da lapela gelou no tubo de plástico, junto ao peito. O palhaço sentiu-a como o próprio sangue que se despedia do calor do corpo.
E o mestre do picadeiro? O entusiasmo desse exuberante apresentador era falso ou verdadeiro?
Reformou-se. Passou a sobreviver de uma pensão que lhe trazia tudo menos dinheiro.
O palhaço?
Bem, o palhaço olhou para o céu (o horizonte dava-lhe um aperto no coração). O rosto do céu chorava e o rosto do palhaço aceitava.
Era tarde. Estava na hora de mais um espectáculo. Mais uma vez, faria rir cadeiras vazias.
Voltou para dentro.
O espectáculo tinha de continuar.
(eu disse para não ficarem tristes)
22 comentários:
ainda bem que avisaste.
Gosto do teu escrever...
E se eu ficar triste?
francis, quem é amigo, quem é?
~
Fada, e se sorrires?
E se o sorriso for triste?
Também faz falta.
Afinal sempre tens respostas... :)
Foste "apanhado" Adão?
Eu não dou respostas, as mentes sagazes é que as deduzem.
(e eu sou... inapanhável)
Tu estás bem?
Oh, terei de explicar que esta tristeza é do tipo que faz sorrir em silêncio, como se soubéssemos tudo o que há para saber?
(estou bem, brigados)
És... um grande aldrabão, perdão, Adão!
Fico à espera que um dia destes perguntes "O que é a alegria?" Pode ser? Perguntas perguntas pedidas? :)
Sou mais Adão do que aldrabão (e olha que Adão não consta no meu BI).
Se souberes o que é a tristeza, não saberás o que é a alegria por exclusão? Mas posso perguntar isso, por aqui, um dia, só para ver se uns sabem responder e outros não. (isto é que vai ser distribuir chibatadas no lombo de quem responder!)
Tenho que resistir à tentação de insultar todos os "Adãos" deste mundo... não é nada pessoal.
Tanto entusiasmo! :p Claro que sei o que é a alegria... mas tu pareces ser do tipo que sabe mas não quer nada com ela.
Estou a abusar?
Queres levantar o véu sobre essa questão do Adão?
Eu amo a alegria! (mais entusiasmo)
Se estivesses a (tentar) abusar, de alguma maneira, eu não te diria, mostrar-te-ia.
O que queres que te diga mais? Melhor descrição que a tua é impossível... Só que eu não sei se seria tão sucinta como Deus... mas ando a treinar para isso ;)
Lamento, pouco convincente.
!? como assim?
Ainda bem que li e segui o teu conselho! hehehehehe
Ana Rita... assim.
Convencida?
~
Only Words, as sensações estão tanto nas palavras que escrevemos como nas memórias que nos assaltam quando as lemos.
"Não sei ser triste a valer", mesmo quando me dói a alma.
Queres os meus sapatos?
Os sapatos não fazem, também, doer os pés?
Fazem muita coisa. Queres mesmo saber?
Convencida. Mas será que devo?
Diz-me lá o que mais fazem os sapatos, a ver se eu também fico convencido.
Gostei muito.
Kitty... :)
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